Resenha: Curva do Rio – R. Colini

Idianara Lira

“É um livro doloroso, regido pela coragem das confissões da personagem. É quase como se a protagonista conversasse com o seu diário, na certeza de que tudo seria apenas o registro mais íntimo e nunca levado a público.” (trecho do prefácio de Joaquim Maria Botelho)

Curva do Rio é uma obra que enche os olhos desde o momento em que nos deparamos com seu maravilhoso projeto gráfico (capa, diagramação, fontes escolhidas e qualidade do papel) entretanto, a obra transcende a beleza estética da primeira impressão e toca profundamente os sentimentos mais diversos de qualquer leitor que se permitir tocar pela narrativa.

SINOPSE:
Uma menina enfrenta a partida do pai e jamais se conformará com essa separação. Enquanto sua mãe transforma a ausência do marido em tabu, durante anos ela tentará esclarecer os mistérios que envolvem o desaparecimento daquele homem. Ao longo das décadas de 1970, 1980 e 1990 no Brasil, três gerações de mulheres precisarão conquistar seu espaço sem pedir licença. No entanto, nem mesmo as diferenças entre elas serão capazes de superar certos impasses da alma, diante dos quais a menina, agora mulher, ainda será surpreendida. “Um aviso ao leitor: este é um livro intenso. A linguagem é preciosa. O tom é vigoroso. A construção, certeira. R. Colini mergulha nos pontos mais profundos das relações humanas com a quase onisciência de quem as viveu.” Joaquim Maria Botelho Escritor, ensaísta, jornalista e ex-presidente da União Brasileira de Escritores.

“Nunca. Esse é o tempo que uma criança não pode entender, e que até hoje eu tenho me recusado a aceitar.” (pág. 7)

“Sempre. Esse é o tempo que me coube. E para que esse tempo me coubesse, durante muito tempo em minha existência omiti as reflexões sentimentais, pois acreditava que só poderia chegar aonde eu queria através da crença inabalável na razão, no esforço sem concessões e na liberdade das escolhas. ” (pág.7)

O livro nos conduz pela trajetória de vida da personagem principal (de sua infância até a vida adulta) a partir do momento em que seu pai parte de casa em busca de um futuro melhor para todos e apesar de prometer que voltaria, infelizmente isso nunca acontece e assim, mãe e filha emigram para tentar descobrir o paradeiro dele e também almejando melhores condições de vida. Porém, a narrativa não se prende no desejo da filha encontrar o pai, ela é focada no desenvolvimento e amadurecimento da personagem principal: suas lutas, derrotas, vitórias, sonhos, realizações, entre outros.

“Mas eu precisava combater a bondade, combater a vida que eu não queria, embora pouco soubesse da vida. Querendo ou não, às vezes, o preço da nossa liberdade deve ser pago por outros, a quem enredamos sem ter a noção de como desatar.” (pág. 26) 

Referente ao autor R. Colini, uma característica que achei muito interessante é o fato dele conseguir expressar de forma convincente, a visão e os sentimentos de uma personagem feminina, demonstrando assim, ter uma sensibilidade que nem todos os autores do sexo oposto, conseguem alcançar. Temas fortes como, por exemplo, o aborto e o quanto isso pode afetar uma mulher, independente do motivo que a levaram a praticá-lo ou a depressão pós-parto e as dificuldades do exercício da maternidade, são abordados de maneira tão reais e repletas de carga emocional, que por vezes me esquecia que foram escritas por um homem, garantindo ao autor excelência em sua escrita.

Curva do Rio é um tributo a força que reside em todas nós mulheres, pois independente das adversidades que nos cercam, nunca desistimos em lutar para alcançar aquilo que desejamos, podemos até mudar de sonhos durante os anos, mas a resiliência em viver, parece ser a constante em todas nós.  

“É hora de admitir que não tenho o controle que julguei ter. De aceitar que a precariedade das certezas é a única coisa constante e que, para uma menina a quem coube desde cedo escolher seu destino e que se iludiu em seu pretenso autoengendramento, é hora, finalmente, de abrir uma concessão para essa coisa furtiva a que chamamos tranquilidade ou paz e admitir que certos eventos, memórias ou desejos nunca terão solução e entendimento. Nunca.” (pág. 221)

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R. COLINI é um escritor que andou fazendo outras coisas por 30 anos e que faz agora meio século de idade. Foi jornalista por dois anos na Folha de S. Paulo e depois decidiu batalhar grana virando empresário. Estudou Filosofia e Ciências Sociais na USP, mas não conclui nenhum dos cursos. Escalou dois dos sete cumes mais altos dos continentes: Elbrus e Kilimanjaro. Montou uma operadora de telecomunicações, mas há três anos, delegou a gestão da empresa. Escreveu três romances e dezenas de contos. Daqui para frente, sua vida será focada na escrita.

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