Segunda Poética: “Da calma e do silêncio” – Conceição Evaristo

Idianara Lira

Da calma e do silêncio

Quando eu morder
a palavra,
por favor,
não me apressem,
quero mascar,
rasgar entre os dentes,
a pele, os ossos, o tutano
do verbo,
para assim versejar
o âmago das coisas.

Quando meu olhar
se perder no nada,
por favor,
não me despertem,
quero reter,
no adentro da íris,
a menor sombra,
do ínfimo movimento.

Quando meus pés
abrandarem na marcha,
por favor,
não me forcem.
Caminhar para quê?
Deixem-me quedar,
deixem-me quieta,
na aparente inércia.
Nem todo viandante
anda estradas,
há mundos submersos,
que só o silêncio
da poesia penetra.

(Conceição Evaristo)

MARIA DA CONCEIÇÃO EVARISTO DE BRITO é uma notável professora e escritora brasileira contemporânea sendo especialmente ativa nos movimentos pela luta negra.

A autora, que publica poemas, ficção e ensaios, nasceu no dia 29 de novembro de 1946 em Belo Horizonte, Minas Gerais.

Algumas das suas obras já foram traduzidas para o francês. Em 2018 venceu o Prêmio de Literatura do Governo de Minas Gerais.

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