Segunda Poética: “Vaidade” – Florbela Espanca

Idianara Lira

Vaidade

Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!

Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!

Sonho que sou Alguém cá neste mundo …
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a Terra anda curvada!

E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto ando voando,
Acordo do meu sonho … E não sou nada! …

(Florbela Espanca)

Florbela Espanca (1894-1930), ignorada pela preconceituosa crítica do início do século, é considerada hoje em dia a mais sublime voz feminina da poesia portuguesa de todos os tempos.

Seus sonetos são um ousado diário íntimo, onde palpitam as ânsias de uma mulher ardente, a clamar pelas carícias de um amor impossível. O caudal dessa insatisfação veio desembocar na trágica madrugada de seu 36º aniversário, quando a bela e carnal alentejana se calou para sempre, após uma dose excessiva de barbitúricos.

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